Quando dois cachorros estão brigando e aparece um terceiro, sabe o que acontece? Este cachorro, o terceiro, vai ajudar o cão mais forte, aquele que, ao que parece, tem mais condições de ganhar a briga.
Ainda não li nada na Etologia sobre as razões desse comportamento (a Etologia estuda o comportamento dos animais irracionais). Mas não precisa ter consciência -- basta instinto – para ver qual é a lógica da atitude. Ao juntar-se ao mais forte para estraçalhar o mais fraco, o terceiro cão segue um instinto natural: estar bem com quem, aparentemente, o possa proteger. Repetindo: quando o terceiro cão ajuda o cachorro mais forte – e contribui para vencer o cão mais fraco --, este terceiro cão sente instintivamente que pode vir a ser beneficiado, pois torna-se amigo do mais forte e poderá receber, quiçá, posterior retribuição (inclusive proteção).
A Ciência já comprovou que, geneticamente, o ser humano é praticamente igual ao chimpanzé e muito semelhante ao camundongo. Se no plano físico é assim, quão idêntico no campo moral o homem se assemelharia ao animal?
Em época de eleições podem-se ver sinais do comportamento interesseiro do bicho-homem; comportamentos iguaizinhos aos sinais que já se confirmam no bicho-animal. De repente, como se fosse o bicho-cigarra, que só dá as caras de 17 em 17 anos, surge candidato tipo cachorro grande, briga com um ou outro cão menor e, em seu favor, já surge uma matilha de cães intere$$ados em ajudá-lo. Nessa matilha, bichos profissionais de diversa estirpe.
É reprovável o comportamento? No campo moral, na filigrana ética, sim. Mas quem está ligando para moral e ética em tempos eleitorais? O que interessa à matilha que se encosta no cão maior é defender não propriamente o cãozarrão, mas a si mesma, matilha de cães, como natural lei da selva -- onde sobreviver interessa mais que conviver. Se o cão grande ganha a eleição, a matilha mostra que esteve/estava ao lado dele, e cobra o apoio; se, por acaso, o grande cão não chega à vitória, não importa, a matilha já ganhou dele... enquanto pôde tirar dele.
É assim que a nave vai, esta nave humana que, mesmo decorridos milhões de anos, ainda é tão imperfeita -- por opção (e é isso que dói). Há a opção de se juntar aos fracos e oprimidos, mas, como são fracos e oprimidos, vêem no cão grande aquilo de que precisam para também se fortalecer nesta selva, ao menos por uns tempos.
Seria o hipocampo o culpado desse comportamento? O hipocampo é uma das estruturas do cérebro mais antigas, em termos de evolução. Ele é o arquivo, a memória não apenas de um ser humano, mas da humanidade, da raça toda dentro de um único ser. O que os seres humanos passaram ao longo das centenas de séculos, dos tempos primitivos à contemporaneidade, está de alguma forma depositado no hipocampo -- que de vez em quando faz uns “saques” desse depósito.
No hipocampo está o que temos de fera e anjo. De divindade e de diabólico. De altruísta e de egoísta. De ternos e de sádicos. Capazes do mais bravo ato de heroísmo, mas igualmente capazes dos mais sórdidos gestos de covardia.
Alojado ali no mais profundo do cérebro, o hipocampo costuma ditar o nosso comportamento apenas baseado nos instintos e nas emoções. Mesmo as funções de raciocínio e aprendizagem, próprias do córtex cerebral, têm de passar antes pelo crivo do hipocampo.
Daí, meus leitores, por esses rudimentos de Neurologia pré-eleitoral, o não se estranhar que apareçam, em favor de cachorros grandes, tantos espaços em mídia, que vão da notinha do jornal à proclamação desabrida em televisão. São pequenos emitindo sinais dúbios de aproximação aos grandes. Organizações comerciais, comunitárias e não-governamentais são usadas para dar a esses comportamentos o viés, o “ajeitamento” formal e legal (nunca ético nem moral).
Os pequenos têm dificuldade de reconhecer os pequenos -- porque não se aceitam pequenos, e podem ser capazes de atos ainda menores para deixarem de ser o que por enquanto são: pequenos. Mas o que certos pequenos têm de aprender é que, aproximando-se de ou defendendo um cachorro grande, não serão grande como ele. Como na história do sapo e do boi, não adianta beber água demais, que não ficará do tamanho do boi. Explodirá, com certeza explodirá.
Somos humanos. Somos (ou deveríamos ser) éticos, morais, culturais, espirituais. Se não fosse assim, Deus não precisava ter feito o humano -- bastava ter parado a Criação nos porcos. Nos camundongos. Nos chimpanzés. Nos cachorros.
Somos humanos. Precisamos deixar de agir como terceiros cães...
Por Edmilson Sanches, jornalista
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